terça-feira, 10 de novembro de 2015

“Tornei-me inimigo de vocês por lhes dizer a verdade?”

Verdade – um conceito maltrapilho em nosso mundo pós-moderno. E em um contexto no qual “cada um tem sua própria verdade”, proclamar uma verdade em termos absolutos é ser odiado e rejeitado de tantas formas quantas “verdades” são reivindicadas. Por que, ao final das contas, se há uma verdade absoluta, a minha verdade individual não vale nada. E mais do que isso, ela requer que eu me sujeite a ela (outro conceito fora de moda). Fomos convencidos a acreditar que a “verdade absoluta” e a sujeição à mesma são definições opressivas e injustas, mas não o são. É melhor depender de uma bússola do que em meros instintos quando estamos perdidos e sem direção. Por sua vez, assumir uma verdade relativa a mim, fundamentada em meus próprios desejos, vontades e inclinações é caminhar sobre gelo fino. Em que momento pareceu mais lógico e seguro que confiemos cada um em suas próprias definições a aceitar uma verdade única independente de nós mesmos (limitados e falhos) e acima de nós?
Aceitar uma afirmação como verdade está, de certa forma, relacionada ao grau de confiança que temos na pessoa que faz essa afirmação. Pouco antes de morrer, Jesus foi interrogado por Pilatos (governador romano sobre a província da Judéia). Nesse diálogo, Jesus falou: “De fato, por esta razão nasci e para isto vim ao mundo: para testemunhar da verdade. Todos os que são da verdade me ouvem" (João 18:37,38). O relato do evangelho continua: "'Que é a verdade?', perguntou Pilatos. Ele disse isso e saiu.” Pilatos tinha a mesma inquietação que a maioria de nós tem: o que é a verdade? Pilatos, apesar de seu questionamento, não permaneceu para ouvir a resposta, ele saiu. Provavelmente por que ele sabia que estava prestes a condenar um homem justo. E nós? Será que estamos dispostos a ouvir a voz daquele que que se autointitula a própria verdade? Ou será que estamos receosos de sermos achados em falta de algo?

Mas veja a maravilha do evangelho: aquele que veio trazer a luz e a verdade ao mundo deu sua própria vida e seu sangue como selo de autenticidade a esse testemunho e também para que pudéssemos ser justificados (isto é, libertos de condenação) e transformados! A verdade de Cristo não veio para nos condenar. Pelo contrário, ela nos mostra, sim, o nosso pecado, mas é para que sejamos libertos do mesmo. A verdade muitas vezes pode parecer dolorosa, mas “Quem fere por amor mostra lealdade, mas o inimigo multiplica beijos” (Pv 27:6). "Digo-lhes a verdade: Todo aquele que vive pecando é escravo do pecado. Portanto, se o Filho os libertar, vocês de fato serão livres.” João 8:34,36

terça-feira, 17 de fevereiro de 2015

“A quem vocês estão procurando?”

Na noite em que foi traído por um de seus seguidores e entregue aos soldados para ser levado preso, Jesus estava reunido com seus discípulos em um olival. Ao perceber movimentação de seus algozes, Jesus lhes dirigiu a palavra, dizendo: “A quem vocês estão procurando?”. A essa pergunta, eles lhe responderam: “A Jesus de Nazaré”. O Senhor então replicou: “Sou eu” (João cap. 18). Em minha percepção, a busca por algo é o fator que torna a vida dinâmica; sem isso não há propósito, apenas inércia e tédio.
“A quem vocês estão procurando?” Essa pergunta parece adquirir um grande peso à medida que nos detemos a ela. Aqueles soldados estavam à procura de Cristo. Não para segui-lo, ou ouvir suas palavras, mas para levá-lo preso. Nos últimos anos temos visto uma verdadeira “revolução evangélica” no Brasil: são milhões de novos adeptos todos os anos, incluindo muitos famosos, que passam a professar a nova religião. Afirmam buscar a Cristo. Mas com que motivação? Testemunhos em programas televisivos escancaram: sucesso profissional, prosperidade material, terapia amorosa, etc. O evangelista Lucas conta que certa ocasião, um homem disse a Jesus: “Eu te seguirei por onde quer que fores”. Jesus respondeu: “As raposas têm suas tocas e as aves do céu têm seus ninhos, mas o Filho do homem não tem onde repousar a cabeça” (9:57-58).
Jesus sempre se mostrou acolhedor. No entanto, nunca deixou de dizer a verdade, ainda que lhe custasse menos popularidade e menos seguidores. No evangelho de João (cap. 6:66) lemos que muitos o deixaram após um “discurso duro”. Mas ele não se esconde, antes, anuncia a si mesmo a todos: “Sou eu”. Ele é o Cristo, a esperança de vida nova. E também alerta: “Ninguém pode servir a dois senhores, porque odiará um e amará o outro”, ou seja, dentre muitos “senhores” e “senhoras” a quem possamos invocar ou servir, ele exige exclusividade, pois “só há um Deus e um mediador entre Deus e os homens, Jesus Cristo”(I Tm 2:5).

Buscar a Jesus é “matar ou morrer”. Ou crucificamos novamente o Filho de Deus ou nos aliamos a ele em sua cruz. A quem você busca? Aqueles soldados e os homens que os enviaram não suportaram a verdade de Jesus, e o procuraram para silenciá-lo. Muitos o buscam não para segui-lo, mas porque querem benefício próprio. Mas se você busca vida plena e esperança, Cristo se pronuncia: Sou eu. 

quinta-feira, 15 de janeiro de 2015

Sonda-me

Sonda-me, ó Deus, e conhece o meu coração; prova-me e conhece os meus pensamentos. E vê se há em mim algum caminho mau e guia-me pelo caminho eterno. Salmo 139:23,24

Essa é uma oração difícil de ser feita com sinceridade! “Sonda-me e conhece o meu coração!” .  Nossa tendência é sempre colocar máscaras, vivemos de aparências. Nossa primeira impressão acerca de uma pessoa é a nossa visão quem dá, relativa ao estereótipo dessa pessoa. Da mesma forma nós também sempre procuramos impressionar aos outros zelando por uma aparência agradável ou, no mínimo, conveniente. Em um certo nível, não há nada de errado em cuidar do exterior; o problema é quando erguemos sobre nós uma camuflagem sobre quem realmente somos, quando agimos com hipocrisia. Mas também é problema quando evitamos o confronto com a Palavra Viva, quando estamos aconchegados em nossa zona de conforto, presumindo que “estamos bem na fita”.
No meio evangélico atual, há essa necessidade de estar sempre bem: os chavões e as “encenações” dentro da igreja estão aí pra provar isso. Escondemos nossas falhas e dificuldades dos outros, de nós mesmos, e achamos que podemos nos esconder de Deus, imaginando que podemos nos tornar mais “aceitáveis” pra Ele (a propósito, Cristo morreu por nós sendo nós ainda pecadores!!). Com isso, somos nós mesmos quem perdemos, deixando passar oportunidades de experimentar de formas muito profundas o amor de Deus e a santificação em nossas vidas.
As Escrituras afirmam que “A Sepultura e a Destruição estão abertas diante do Senhor; quanto mais os corações dos homens!” (Provérbios 15:11). Deus conhece o profundo de nossos corações: anseios, intenções, pensamentos, desejos e pecados. O Senhor Jesus falou com a igreja de Laodicéia no livro de Apocalipse, dizendo:
Conheço as tuas obras, que nem és frio nem quente; quem dera foras frio ou quente!
Assim, porque és morno, e não és frio nem quente, vomitar-te-ei da minha boca. Como dizes: Rico sou, e estou enriquecido, e de nada tenho falta; e não sabes que és um desgraçado, e miserável, e pobre, e cego, e nu; Aconselho-te que de mim compres ouro provado no fogo, para que te enriqueças; e roupas brancas, para que te vistas, e não apareça a vergonha da tua nudez; e que unjas os teus olhos com colírio, para que vejas. Eu repreendo e castigo a todos quantos amo; sê pois zeloso, e arrepende-te. Eis que estou à porta, e bato; se alguém ouvir a minha voz, e abrir a porta, entrarei em sua casa, e com ele cearei, e ele comigo.
  Apocalipse 3:15-20
Uma das cenas mais engraçadas e ao mesmo tempo mais tristes é quando observamos pessoas que “se acham” mas não são – estão plenamente convencidas em si mesmas que estão no topo, enquanto que, na verdade, todo o resto vê uma situação muito diferente.
Vamos visitar uma passagem dos evangelhos sinóticos que pode nos ajudar a refletir sobre essa verdade em nossas próprias vidas, e que também vai nos confrontar:
Quando Jesus ia saindo, um homem correu em sua direção, pôs-se de joelhos diante dele e lhe perguntou: "Bom mestre, que farei para herdar a vida eterna? "Respondeu-lhe Jesus: "Por que você me chama bom? Ninguém é bom, a não ser um, que é Deus. Você conhece os mandamentos: ‘não matarás, não adulterarás, não furtarás, não darás falso testemunho, não enganarás ninguém, honra teu pai e tua mãe’". E ele declarou: "Mestre, a tudo isso tenho obedecido desde a minha adolescência". Jesus olhou para ele e o amou. "Falta-lhe uma coisa", disse ele. "Vá, venda tudo o que você possui e dê o dinheiro aos pobres, e você terá um tesouro no céu. Depois, venha e siga-me".
Diante disso ele ficou abatido e afastou-se triste, porque tinha muitas riquezas.
Jesus olhou ao redor e disse aos seus discípulos: "Como é difícil aos ricos entrar no Reino de Deus!" Os discípulos ficaram admirados com essas palavras. Mas Jesus repetiu: "Filhos, como é difícil entrar no Reino de Deus!  É mais fácil passar um camelo pelo fundo de uma agulha do que um rico entrar no Reino de Deus".
 Marcos 10:17-25
Vemos aí a história de um homem piedoso conforme a lei e as tradições judaicas. Tinha uma vida religiosa “pra ninguém botar defeito”. Ainda assim, ele recorreu a Jesus. Não sabemos sua motivação ao fazê-lo, mas duas hipóteses me passam à mente (que não refletem necessariamente a verdade): 1) Ele esperava ouvir elogios de Jesus por sua fidelidade à lei, ou 2) Ele imaginava que Jesus lhe daria mais mandamentos para que ele cumprisse (e assim teria mais piedade...).  Mas Jesus lhe desvendou o coração.
Ele se ajoelhou diante do Senhor e chamou-o de “bom mestre”. Provavelmente esse tipo de reverência era desejada pelos fariseus e mestres da lei da época, mas Jesus parece ter feito pouco caso. Em resposta à pergunta do homem rico, Jesus deve ter soado como “Como assim, ‘o que farei pra herdar a vida eterna’? Você já não conhece os mandamentos?” Isso parece um tanto quanto provocativo, em um bom sentido, da parte do Senhor. Talvez para saber se o rapaz se contentava com aquilo, ou se estava insatisfeito, se havia inconformismo. “Que me falta ainda?”, disse o jovem, segundo o relato de Mateus. Mais uma vez, é difícil perceber a motivação do rico com essa questão. Poderia ser sincera, ou então legalista ou pretexto pra se gloriar.
Mas o detalhe que só existe no livro de Marcos é esse: “Jesus olhou para ele e o amou”. E não importa o que trazemos conosco, esse é olhar de Jesus sobre nós também. E não importa o que ele venha a nos dizer, será dito com amor. E nesse momento é que Jesus desvenda o coração desse jovem rico. Várias vezes os evangelhos relatam que “Jesus conhecia os pensamentos” e o coração do ser humano. E ele sempre confrontava, em um bom sentido, cada um com quem ele tratava, como quem confronta uma mentira. Os dependentes químicos aprendem que o primeiro passo pra recuperação é admitir o problema. E a didática de Jesus passa por essa etapa. Foi assim com Nicodemos (“És mestre em Israel e não sabes estas coisas?”), com Pedro, com Tiago e João, e com vários outros, e é assim conosco também. Jesus não se conforma em deixar que vivamos nossas mentiras, nossa fuga de nós mesmos. Ele deseja nos curar!
Em seguida, Jesus lhe disse: "Se você quer ser perfeito, vá, venda os seus bens e dê o dinheiro aos pobres, e você terá um tesouro no céu. Depois, venha e siga-me" (Mateus 19:21). E foi nesse ponto que Jesus tocou na ferida, expôs o interior daquele homem para que ele mesmo pudesse contemplar. Ele quis mostrar que apesar da obediência irrestrita à Lei, o coração do jovem não estava em Deus. Então, o Senhor lhe propõe renunciar àquilo que lhe governava o coração. E esse é o segundo ponto da didática Divina: a entrega. Foi assim com Abraão, que após 25 anos de espera gerou a Isaque aos 100 anos de idade, fruto da promessa de Deus, e foi desafiado a devolvê-la a Deus, para que seu coração não estivesse na promessa, mas sim naquEle que prometeu. Foi assim com Paulo, que tendo muitos motivos pra se gloriar na sua formação humana rejeitou tudo como refugo, a fim de ganhar a Cristo. E então Jesus convidou o jovem rico a segui-lo.
Diante disso ele ficou abatido e afastou-se triste, porque tinha muitas riquezas. Sua tristeza passou pelo enfrentamento da realidade de seu coração e da impossibilidade de renunciar isso. O propósito dessa análise não é, de forma alguma, julgar esse homem; é de identificar-nos com ele. Somos mais parecidos com ele do que pensamos. Seu destino foi essa tristeza, e sua escolha de se afastar. Quando nos conformamos, nos afastamos. E, sem dúvida há muitas coisas que podem dominar nosso coração, mas não podemos ignorar o fato de que dentre todos eles Jesus destacou as riquezas. Isso porque além de exigir de nós o amor que é devido a Deus como as outras coisas, as riquezas nos fazem confiar e depender nelas. Jesus se indignou com a atitude do homem e fez o desabafo em seu lamento.

E nós? Desejamos que Deus realmente sonde os nossos corações?  Estamos preparados para permitir que o Senhor nos tire do nosso conforto e trabalhe fundo no nosso ser?

Ou será que ele já tem nos mostrado algumas coisas, e estamos relutantes? O conformismo é perigoso! Se não persistimos em oração diária por santificação, já estamos nos afastando!

Na realidade, se estamos em Cristo, precisamos permitir que o Senhor faça isso. Precisamos orar sempre, em humildade e contrição, para que o nosso coração não nos engane e não nos afaste dos caminhos do Senhor:

Cuidado, irmãos, para que nenhum de vocês tenha coração perverso e incrédulo, que se afaste do Deus vivo. Pelo contrário, encorajem-se uns aos outros todos os dias, durante o tempo que se chama "hoje", de modo que nenhum de vocês seja endurecido pelo engano do pecado,  pois passamos a ser participantes de Cristo, desde que, de fato, nos apeguemos até o fim à confiança que tivemos no princípioHebreus 3:12-14
Examinem-se para ver se vocês estão na fé; provem-se a si mesmos. 2 Coríntios 13:5ª

Não precisamos temer o que pode surgir! Cristo morreu por nós enquanto ainda éramos pecadores! Quanto mais Deus não demonstrará seu amor para conosco agora que buscamos por sua graça!
Que o Espírito Santo clame em nossos corações contra toda a injustiça em nós, contra todo o pensamento que se levante contra o conhecimento de Cristo!


Rogo-vos, pois, irmãos, pela compaixão de Deus, que apresenteis os vossos corpos em sacrifício vivo, santo e agradável a Deus, que é o vosso culto racional. E não sede conformados com este mundo, mas sede transformados pela renovação do vosso entendimento, para que experimenteis qual seja a boa, agradável, e perfeita vontade de Deus. Romanos 12:1-2